domingo, 26 de janeiro de 2014

Roberto Itimura, um atleta de “Coração Valente” - O Corretor Corredor

Roberto Itimura não tem medo da morte e faz do esporte um trabalho de inclusão social e sociabilização

A mensagem de que os obstáculos na vida surgem para serem superados foi levada ao pé da letra por Roberto Itimura, de 52 anos. Coordenador e programador de manutenção de uma multinacional do setor químico, ele aprendeu a gostar de caminhar e de correr (já participou de maratonas, inclusive) por recomendação médica, após sofrer três enfartes em menos de dois anos. Hoje, o bem-humorado Itimura integra o grupo "Running Jundiaí", que tem 595 membros e ajuda iniciantes e cadeirantes a praticar esporte da forma correta, para que tenham qualidade de vida e superem os obstáculos.


A história de obstinação de Itimura começou quando ele tinha 16 anos. E com um grande susto. Nascido em Penápolis, no interior paulista, mora em Jundiaí há 44 anos, ao lado da esposa e das três filhas, e adora a cidade, mas quando era adolescente foi vítima de um acidente que mutilou sua mão direita e quase lhe deixou cego. Ele desmontou uma bomba de São João e colocou a pólvora dentro de um vidro, fazendo um artefato. Foi então jogá-lo e a bomba explodiu na altura do rosto. Itimura teve a mão ferida e ficou com 120 pequenos cacos de vidro nos olhos, extraídos em cirurgias ao longo de meses de recuperação. "Pior do que tudo isso foi a entrada de enxofre na corrente sanguínea. Na noite em que fui internado, os médicos praticamente me condenaram à morte. Inchei muito em decorrência da substância no organismo e tive partes do corpo pretejando. Acabei desenganado e a minha família, aconselhada a rezar", contou.

Católicos, os pais de Itimura fizeram correntes de oração. Horas depois, o enxofre começou a sair do corpo do rapaz, que passou a desinchar. Se isso ocorresse, segundo os médicos, ele seria operado. "Meu tio não deixou que amputassem a minha mão em Jundiaí e eu fui levado ao Sírio Libanês, em São Paulo, para que se tentasse reconstruí-la. Fui atendido por um médico especialista em mãos e operado. Foram seis meses de várias intervenções e hemodiálises, já que meu sangue precisou ser quase todo filtrado", lembrou. Todo o trauma pelo incidente com a bomba durou cerca de um ano e meio.

A maior consequência para o tímido Itimura foi isolar-se do mundo de vez. Os rapazes da idade dele queriam mais era sair, mas Itimura permanecia em casa, assistindo filmes na TV. "Às vezes, minha família me obrigava a sair e eu ficava com a mão no bolso. Se uma área do local em que estava tinha muita gente, escolhia outro canto para permanecer. Na escola, ficava sempre encostado na parede do lado direito da classe, para esconder a mão atrofiada", lembrou.

O coordenador e programador de manutenção demorou para adaptar-se à vida de canhoto. "Levei um ano e meio para me acostumar a escrever com a mão esquerda e devo isso ao contador da empresa de meu tio. Era o Romeu Piza, que me incentivou a fazer escrita fiscal usando caneta tinteiro. O trabalho era feito em um livro e exigia todo capricho de minha parte."

Itimura não praticava esporte e chegou a pesar 117 quilos com 18 anos. Admite que, no futebol, sempre foi uma negação. "Aliás, japonês para jogar bola é horrível (risos). É bom para pingue-pongue... Pratiquei futsal para me enturmar, mas era o último a ser escolhido. Geralmente ia para o gol", brincou o corredor.

Mas o esporte fazia parte do cotidiano dele. Sempre apreciava a corrida de São Silvestre pela TV, todo dia 31 de dezembro. Praticar não era com ele, que logo tirou carteira de motorista. "Isso sim me ajudou. Eu já dirigia carro e até trator no sítio de minha família. A mão mutilada não me atrapalhou. A partir daí, saía mais de casa. Trabalhava com um ajudante na rua, fazendo a parte mais burocrática, e o ajudante, o serviço braçal."

Nesta época, o futuro corredor passou a frequentar mais a igreja messiânica, onde conheceu sua esposa. Eles se casaram e tiveram três filhas, hoje com 30, 28 e 18 anos. "Minha esposa me deu muita força para vencer o problema que tinha na mão. Foi o início de minha saída do “cantinho”. Eu era introspectivo e depois do incidente da bomba isso aumentou. Minha esposa me provou que eu não era rejeitado. Emagreci bastante, ficando com cerca de 80 quilos. Estava com a autoestima baixa e superei tudo isso", comemorou.

Reportagem de Paulo Behr Ferro para o JJ Regional publicada em 25/01/2014